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EXERCÍCIO ÉTICO NAS PROFISSÕES

EXERCÍCIO ÉTICO NAS PROFISSÕES

EXERCÍCIO ÉTICO NAS PROFISSÕES

O direito à liberdade de qualquer trabalho, oficio ou profissão é garantia pétrea e fundamental de todos os brasileiros conforme dispositivos do Artigo 5.º da Constituição Federal. Porém, esta liberdade, em determinadas situações, é limitada por interesses maiores da sociedade. Vale a máxima: O direito de um termina onde começa o direito do outro!

 

A princípio, toda profissão seria de livre exercício, mas existem algumas exceções, que são as profissões que a Lei (a Sociedade, por seus representantes no Poder Legislativo) entende como mais relevantes ao bem estar social, para as quais somente alguns, devidamente qualificados e habilitados, poderão exercer.

 

As engenharias, a agronomia e as geociências não são profissões de livre exercício à qualquer cidadão, estas profissões são regulamentadas por Leis e Decretos que, não só restringiram seu exercício somente à profissionais qualificados e legalmente habilitados, como também criaram estruturas de Estado incumbidas de organizar, controlar e fiscalizar o seu exercício, o chamado Sistema Confea/Creas, composto pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia e os vinte e sete Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia.

 

De se perguntar! Qual a razão desta intervenção na liberdade e nos direitos dos cidadãos? Qual a relevância destas profissões para os interesses da sociedade? De forma geral, ao exercer suas atividades, os profissionais jurisdicionados ao Sistema Confea/Creas utilizam seus conhecimentos científicos para projetar e executar a moldagem da energia e da matéria com vistas a produzir bens e serviços de interesse da sociedade. Assim sendo, o exercício destas profissões possuem fortes impactos em quatro interesses sociais difusos, quais sejam: a saúde e a segurança das pessoas, o meio ambiente e o patrimônio de terceiros. Assim, o mau exercício destas profissões podem trazer incalculáveis prejuízos à sociedade.

 

Do quanto abordado até aqui, evidentemente que os habilitados para exercer essas profissões de mais importância aos interesses sociais e humanos, devem ser profissionais tecnicamente habilitados para tanto, com uma qualificação mínima para o exercício profissional, exigida pela Lei.

 

Destas afirmativas, decorrem três premissas básicas, quais sejam:

 

• A primeira, é que somente a Lei (sociedade) pode restringir o exercício profissional àqueles que tenham a qualificação técnica e cível mínima;

• A segunda, e mais importante, é que o exercício restritivo dessas profissões devem ser necessariamente direcionadas ao bem estar social;

• E a terceira, que o mau exercício dessas profissões, pela importância que estas

têm ao bem estar social, deve implicar ao profissional, em caso de má conduta, consequências mais drásticas que nas profissões não regulamentadas.

 

Esta exceção criada pela Lei, privilegiando os profissionais habilitados a exercer reservadamente a profissão, não se trata de um privilégio no sentido de trazer maiores benefícios ou vantagens à uma determinada casta de cidadãos em detrimento de outros. Trata-se sim de um cuidado do Estado para com a sociedade, de forma que

apenas profissionais que cientificamente conheçam o ofício, e, com isso, tragam segurança, destreza, zelo, cuidado, ciência e, sobretudo, responsabilidade, é que possam exercer tais profissões.

 

O termo responsabilidade (do latin “spondeo” = eu prometo) pode ser entendido no exercício da profissão como o ato de assumir para si e para a sociedade a promessa e a garantia de que tudo será feito à luz da ciência e do saber cientifico inerente a uma profissão, cujo operador é o profissional. Também advém daí o dever que cabe a cada profissional de arcar com as consequências por efeitos não desejados e por resultados danosos aos interesses sociais e humanos, principalmente se decorrentes de conduta inadequada do profissional. É importante que o profissional não descure das três principais fontes de problemas no exercício profissional, todas relacionadas a conduta ética e moral: a imperícia, a imprudência e a negligência.

 

É imperito o profissional que se incumbe de atividades para as quais não possua conhecimento técnico suficiente, mesmo tendo legalmente essas atribuições, pois as atribuições (ou competências) decorrem do pertencimento a uma modalidade profissional, já a perícia decorre dos conteúdos de formação curricular. As atribuições são coletivas, já a pericia é individual.

 

É imprudente o profissional que, mesmo podendo prever consequências negativas, pratica ato sem considerar o que acredita ser fonte de erro, assim, é altamente recomendável que o profissional tenha esmero e dedicação na fase do exercício profissional em que são realizados os estudos, verificações, analises e levantamentos que precedem a elaboração dos projetos e sua posterior execução, sob pena de incorrer em responsabilidade na modalidade “culpa” por não ter se cercado de todos os cuidados no exercício de sua profissão.

 

É negligente o profissional que atua de forma omissa não cumpre com seu dever, principalmente seu dever de participar ativa e objetivamente na autoria do projeto ou na execução da atividade ou do empreendimento pelo qual se incumbe e assume a responsabilidade técnica. O exercício profissional deve se dar no limite da capacidade pessoal de realização de cada profissional. O “acobertamento” profissional é a pior das

pragas que ameaça as profissões regulamentadas! Ao não participar efetivamente de sua obra o profissional esta colocando seus interesses pessoais acima de tudo e de todos, praticando ato desprezível que merece a reprovação de toda a comunidade profissional.

 

Neste sentido vale trazer a baila o “principio da hierarquia dos interesses” que se faz presente sempre que um ato profissional é contratado e realizado. De plano, sempre que um contrato verbal ou escrito é estabelecido para o exercício de um ato profissional, duas partes (ou interesses) estão envolvidas, quais sejam: os interesses do contratante e os do contratado. De um lado o contratado deseja a melhor remuneração, a construção de sua carreira ou portfólio de clientes e ainda a segurança de suas atividades. De outro lado o contratante deseja a entrega o objeto do contrato no menor tempo, ao melhor preço e com a melhor qualidade e segurança. Ocorre que acima destes dois interesses, estão os interesses das profissões e da sociedade! Vale lembrar Ética e

responsabilidade que a Lei obriga os cidadãos sem habilitação profissional (leigos) a contratarem os profissionais quando necessitam de soluções nas áreas das engenharias, agronomia e geociências. Ora, se a Lei obriga a contratação de profissionais por parte dos leigos, por obvio que acima dos interesses destas duas partes estão interesses maiores, quais sejam: Acima dos interesses dos profissionais estão os interesses das profissões e acima dos contratantes estão os interesses da sociedade! Advém dai o termo “responsável

técnico”, que é uma figura criada pela Lei para planejar, administrar, conduzir e controlar as atividades de um empreendimento ou de uma empresa ligados às engenharias, agronomia ou às geociências, cabendo a ele, responsável técnico, a competência e o dever de zelar pelos interesses da profissão e da sociedade no empreendimento ou empresa em que é responsável técnico, cabendo também a ele a responsabilização por efeitos danosos a tais interesses e que possam advir do empreendimento ou do processo produtivo empresarial.

 

Ao respeitar esta hierarquia de interesses (1.ª sociedade, 2.ª as profissões, 3.º o contratante , 4.º o profissional) o profissional estará edificando sua profissão, construindo um ambiente positivo ao exercício das profissões e contribuindo para o desenvolvimento sustentável da nação, com preservação ambiental e respeito aos interesses sociais e humanos. Porém, se ao contrário, ele inverter esta hierarquia, colocando seus interesses pessoais ou de seu contratante acima dos interesses da profissão ou dos interesses da sociedade, estará desconstruindo sua profissão, produzindo todo tipo de maleficio à saúde e a segurança das pessoas e ao meio ambiente e estará contribuindo de maneira irreversível para a desregulamentação de sua profissão.

 

De consequência, percebe-se a enorme importância na correta aplicação dos conhecimentos científicos e tecnológicos adquiridos pelo profissional, além da adoção de uma conduta ética e moral que esteja à altura de sua profissão. O exercício profissional exige muito mais do que a formação técnico-científica ministrada e certificada pela academia, o profissional deve efetivamente conhecer de seu ofício e exercê-lo com zelo, denodo e, acima de tudo, postura ética.

 

E como saber se estamos agindo com postura ética?

 

Segundo Immanuel Kant, filósofo prussiano considerado como o principal filósofo da era moderna, uma intenção é boa ou tem valor moral (postura ética), quando o cumprimento do dever é o único motivo em que a ação se baseia. Se todos atuassem segundo a teoria de Kant, não haveria necessidade de normas e

regras de conduta, sequer seriam necessárias as estruturas de controle, fiscalização e repressão, pois todos agiriam no estrito senso do cumprimento do dever. Porém, a vastidão e a volatilidade das leis morais que habitam dentro de cada um, fazem com que as decisões e ações adotadas sejam influenciadas e motivadas por interesses, muitas vezes, inconfessáveis. E se há razões para não contar, estas são as razões para não fazer, conforme nos ensina o também filósofo Mario Sergio Cortella: “tudo aquilo que não puder contar como fez, não faça!” A agitação da vida moderna, via de regra, nos torna mais superficiais e não nos permite o aprofundamento nestes conceitos filosóficos acerca da natureza humana, nem sempre de fácil absorção. Assim, torna-se indispensável o conhecimento e o alinhamento da conduta profissional ao pacto que todos os profissionais são signatárias pelo ato de juramento realizado na cerimônia e colação de grau, qual seja: O Código de Ética Profissional. A promessa de exercer a profissão observando os princípios éticos é lugar

comum em todos os juramentos que marcam o inicio da vida profissional. Um pacto firmado pela comunidade profissional e balizador da defesa e do fortalecimento das profissões jurisdicionadas ao Sistema CONFEA/CREAs! Assim pode ser definido o Código de Ética Profissional das Engenharias, da Agronomia, da Geologia, da Geografia e da Meteorologia, adotado pela Resolução 1002 do CONFEA, em vigor desde o ano de 2002. Trata-se de um pacto, pois suas bases foram lançadas pelas mais de quinhentas entidades de classe que congregam profissionais de todas as modalidades e que atuam em todas as regiões do País. A comunidade profissional debateu e definiu os princípios do que é certo e do que é errado, do que é honesto e o que é desonesto, do que é bom e do que é ruim no exercício das profissões, fixando o que podemos chamar de “a moral média da comunidade profissional jurisdicionada ao Sistema Confea/Creas”. Finalizada a redação do pacto, o que se deu no Colégio da Entidades Nacionais – CDEM, órgão colegiado consultivo do Conselho Federal, foi editada a Resolução 2002/2002 que adotou o pacto firmado entre os profissionais, conferindo-lhe força legal e propiciando a instalação de processo administrativo em desfavor daqueles que se desviam de seus princípios. Emprestando os conceitos da competência multifocal¹, podemos traduzir a moral média (ética) de uma comunidade como sendo o produto de seus valores multiplicado pelas suas atitudes (É = V x A). De consequência, por regra básica da matemática, ainda que o grupo tenha bons valores morais, se suas atitudes tendem a zero, também a moral média do grupo tenderá a zero. Lado outro, também é possível potencializar os resultados da conduta ética desejada. Se o grupo tiver bons valores morais e atitudes proativas, poderá “bombar” a moral média da comunidade profissional, bastando para isso exercitar a honestidade, a consciência do dever, a cooperação, o compromisso, a honradez, a coerência, a sabedoria e a humildade entre tantas outras virtudes humanas, no exercício da profissão (É = (V x A)vh). No contraponto estão as limitações humanas (É = (V x A)vh/lh) que, se praticadas, reduzem e dividem a moral média da comunidade. A soberba, a indiferença, a omissão, a ganancia, a desonestidade, a conivência, o individualismo, entre tantas outras limitações humanas, infelizmente são condutas que, não raro, ainda observamos no exercício da profissão. Todos são detentores de virtudes e limitações, todos tem o livre arbítrio de decisão caberá a comunidade profissional a decisão do como se portar frente aos desvios de conduta dos pares e colegas de profissão. Embora o código de ética profissional e

seus desdobramentos administrativos, se prestem razoavelmente bem para incentivar a reabilitação do profissional que se desviou do bom caminho, não é razoável esperar que ele, por si só, consiga produzir um ambiente saudável sob o ponto de vista moral e ético para o exercício das profissões. É necessário que os princípios morais contidos no código sejam adotados pela maioria dos profissionais como instrumento para nivelar as Leis morais internas da classe profissional e que isso possa produzir, como resultado, a indignação necessária à uma postura proativa das comunidades corporativas, expurgando o oxigênio do mau exercício da profissão e elevando o custo para aqueles que se desviam do bom caminho. A pena de rejeição do grupo de convivência é certamente a mais eficaz, senão a única, capaz de verdadeiramente promover a melhoria

da conduta. Não basta apenas evitar o mau exercício da profissão, é necessário combate-lo, é necessário rejeitá-lo!

 

1.Francischini, Paulo Henrique.

Competência Multifocal, Academia de Inteligência / 2005

 

 

 

Engenheiro Agrônomo Celso Ritter

Superintendente do CREA-PR

https://www.crea-pr.org.br/ws/etica-e-responsabilidade/